Crise

Por causa dos ilusionistas é que hoje em dia muita gente acredita que poesia é truque...

Mario Quintana - Sapato Florido, 1948.


quinta-feira, 24 de abril de 2014

VIAJAR É MAIS QUE PRECISO*


Preparou-se para aquela
que não sabia ser sua pequena,
grande ou maior viagem.

Preparou-se para aquela
que não sabia ser sua amena,
áspera ou derradeira viagem.

Preparou-se para aquela
que não sabia ser penúltima,
ou mais uma daquelas passagens.

E o fez com o mais cuidadoso
e lúcido, ácido e ávido pensar.

Sabia que devia; que havia 
de assim melhor ser: para ele
um singular e sobreviver:

Fosse na Luz aguda e infinita
Ou na Treva arguta e maldita.

Mas, sem rancor ou medo,
ímpar Fé ou maior descrer,
sabia que já estava pronto.

Mãos e olhos fixos; o corpo
disposto, as mãos desatadas:
nos lábios as últimas palavras.

Por entre os dedos, o Tempo,
em horizonte perto ou distante,
não mais lhe ditava as regras!

Ele, nem vítima, herói ou rei, 
não mais construía verdes pontes. 
Agora, só admirava o abismo.

Assim, ciente de que o coração;
da sua, nem árdua, original, difícil 
e inversa decisão, sem medos 
ou oração, já não vinha tão cedo. 



em "Dunas de Marfim"


[Arte: Gabiel Pacheco]

3 comentários:

  1. Parabéns querido amigo Jairo!!! Contente em visitar sua casa virtual onde transborda sensibilidade e toca o meu coração!!! carinho--Renata Carone Sborgia--dia 26/09/14--

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  2. "Por entre os dedos, o Tempo,
    em horizonte perto ou distante,
    não mais lhe ditava as regras!"

    Tudo que você inspira é a mais fina flor de Poesia.

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  3. "Ele, nem vítima, herói ou rei,
    não mais construía verdes pontes.
    Agora, só admirava o abismo."

    E eu me pergunto, como na música de Milton Nascimento: este verso>> como não fui eu quem fiz?

    Admirável Poeta!

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